sábado, janeiro 23, 2016

Ao almoço

                       

            Pouco depois de entrar indicaram-lhes a mesa, entre grande confusão de pernas, gente, cadeiras, mais pernas movimentando-se, cotoveladas, pequenos encontrões. Já não se lembrava de quem lhe indicara aquele restaurante, mas, fosse quem fosse, tinha-lhe dito para não levar crianças. Passaram uns sujeitos com uns fardos de palha, para a cerveja e o whisky, disseram, e mais uns outros com umas panelas de lúpulo. De vez em quando corriam uns animais, coelhos, galinhas, bezerros, sempre perseguidos a alta velocidade por cozinheiros de facas e machados na mão. Vinham atrás uns tipos com uns alguidares, provavelmente para amparar o sangue. Foi aqui que começou a história do porco...
            Alguém se lembrou de pedir rojões. De repente apareceu um porco a fugir por entre as mesas, com o cozinheiro de grande facalhão atrás. Zás! Espetou-lhe certeiro entre a quarta e a quinta costela, mas parece que devia ter sido entre a sexta e a quinta. Vai daí o porco não tombou redondo à primeira, fugiu cheio de sangue. O tipo do alguidar ia fazendo pontaria inutilmente... “Porra, vê lá se acertas no gajo!” O cozinheiro espetou outra vez. O reco tombou redondo e o tipo do alguidar foi aviando o povo que tinha pedido sarrabulho. De qualquer modo devia ser sarrabulho instantâneo, porque aquilo não dava tempo para grandes preparos. Penduraram o porco, de cabeça para baixo, por pouco tempo, porque alguém pediu a cabeça, e de repente já era difícil dizer em que posição estava.

            A coisa ainda demorou, porque aviaram primeiro os clientes das febras e das costeletas, e depois os do pernil, e finalmente os dos rojões. Não se pense que isto foi um processo pacifico. Além de haver muita gente a reclamar, houve também quem se enojasse e se tenha vertido abundantemente pelas tripas superiores e inferiores. Andava sempre gente a correr de um lado para o outro com saquinhos de plástico, mas depressa apareceram com uns baldes porque não davam vazão. Havia também quem comesse desalmadamente, com as beiças escorridas de molho e baba, porque aquilo abria-lhes muito o apetite. Esta gente fazia questão de comer neste restaurante cuja especialidade eram os túbaros de qualquer quadrúpede desgraçado que ali aparecesse.