Miroslav
É sempre qualquer coisa
relacionada com folha branca e um primeiro encontro sonoro com o contrabaixista
Miroslav Vitous. Ladislav, idealista indiano a tocar contrabaixo, apesar do
nome sugerir outra coisa, neste momento ficou indiano, a tocar uns temas em
quarteto, ele, o piano e a bateria. Era quarteto porque, de vez em quando, ele
fazia uns vocalizos estranhos. Parece que o homem da gaita não tinha aparecido
nesse dia.
Ladislav, sou Ladislav,
nasci em Bombaim numa noite de Inverno em que as portas se fechavam como medos
por causa dos disparos. Por isso não me censuro quando as estrelas se alinham
no Penedo do Lobo, porque a contracção do pensado com o real é acaso, puro e
mero acaso, ordem rigorosamente determinada pelo acaso rigoroso.
Não sei se me estão a ver
de boné, a gola do casaco de fazenda levantada, o ar cinzento na face rosada de
tinto, um bafo de baixas temperaturas perdido no nevoeiro.
Ora aqui estamos nós numa
ponte. Não é muito alta. Parece daquelas pontes sobre o Sena. O protagonista
lança-se em perseguição de si mesmo, correndo pelas ruas mal iluminadas, após
ter roubado as toalhas do hotel. Continua com o boné e o casaco cinzento.
Sou Miroslav, Ladislav, o
que quiserem, mas lavem-me a alma, que eu não quero ver fugir o vento. Já me
quiseram impingir um espírito de sino, até me disseram que a vida tem cadência
de badalo, mas não quis confundir a aldeia.
Talvez seja por isso que
bebo regularmente, como se cumprisse uma pena oculta, um castigo desconhecido
de um crime imaginário. Provavelmente sou culpado. Culpado de sonhar, de ouvir
minuetos de Beethoven e outras peças a três por quatro.
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